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CONVITE PARA UMA DANÇA - Chico





CONVITE PARA UMA DANÇA


Olhando pela janela do sobrado em frente à praça, na pequena cidade do interior, a menina sonhava. Havia tanto para sonhar.
Na verdade, tudo o que havia era o sonhar com coisas que, na manhã de sua vida, ainda não podia entender nem explicar.
Assim começam muitas histórias. E cada uma se desenvolve como as circunstâncias permitem. Ou restringem.
Essencialmente romântica, ela se sentia diferente de todas as outras mulheres que conhecia. Ainda mais num período em que o romantismo cede muito espaço para outros “ismos”, que se revezam na preferência dos que vivem sua juventude.
Naquela tarde, ela conversava sobre isto com um amigo, cuja presença lhe fazia muito bem e a levava às confissões das esperanças que haviam ficado guardadas em seu coração.
Revelou que, quando criança, queria ser uma princesa e morar num castelo bonito, do jeito que havia concebido em suas primeiras ilusões.
Não parou por aí. Disse, também, que quando começou a crescer percebeu seu castelo distorcido, se transformando num lugar frio, sem emoção, parecido com os mostrados nas cenas de filmes de suspense.
De certa forma, ela havia passado a temer os castelos. Mas se encantava com os jardins, pois lhe transmitiam impressões de magia, emoção, liberdade. Sonhava com imensos jardins floridos: neles deixaria a música tomar conta de seus sentidos, aceitaria convites para dançar e seria feliz a seu modo.
Na busca por converter essas metáforas em realidade, sempre arquitetava seus planos e se empenhava para concretizá-los.
Naquela tarde, ela também confidenciou diversos detalhes dos seus próximos passos. Agora o tempo para sua partida estava sendo marcado em semanas e, nesta nova perspectiva, tudo deveria ser muito rápido.
E aconteceu mesmo como ela esperava, na época estabelecida. Não conseguiu se despedir do amigo mas, como o conhecia profundamente, sabia que ele tinha capacidade ilimitada para compreender suas razões. Suas muitas razões.
Alguns meses depois, enviou-lhe uma fotografia. Sentada num banco de um imenso jardim florido, ela era toda felicidade: parecia estar ouvindo a música de sua vida e trazia um largo sorriso nos lábios. O mesmo sorriso com que costumava encantar a todos os que a conheceram.
O amigo então se convenceu de que ela havia encontrado seu caminho. Também sorriu e se sentiu muito feliz.
Em seu silêncio, muitas vezes considerou a possibilidade de ir ao encontro dela, no imenso jardim florido, rever seu lindo sorriso, ouvir as canções ao seu lado e convidá-la para dançar.
Imaginou, também, como seria maravilhoso se ela aceitasse o convite.

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