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Mostrando postagens de agosto, 2014

LÁPIS OU CANETA? - Maria Cristina

O melhor amigo de quem gosta de histórias, apesar de todo aparato tecnológico disponível, é, ainda, um lápis. Ou seria melhor eu falar por mim e dizer que meu melhor amigo (sim, sou uma apaixonada por histórias) nesses últimos tempos é um lápis? Na verdade uma lapiseira: vermelha, cheia de vontade própria, nada discreta, que se joga na minha mão a cada microssegundo de inspir ação. Lembro-me das minhas primeiras palavras escritas: eram quase "desenhadas" com grafite (incrível como parece que faz tão pouco tempo). Em quase todas as tentativas de juntar letras e sílabas se fez necessário o uso da borracha, leal companheira, salvadora de garranchos, descaprichos e erros. O lápis, se bem acompanhado, a seu modo permite o retorno, o recomeço, o ajuste. História nenhuma traça seu caminho sem uma borracha que, debochada e leve, vive do prazer de desconstruir, derrubar, apagar e mudar as rotas (e sem grandes dificuldades). Canetas assinam documentos, não contam histó

QUANDO O AMOR GERMINA - Chico

Quando o amor germina, a vida se apronta para o que virá.  E será celebrada a diferença entre o que foi amargo e o que passou a ser intenso. QUANDO O AMOR GERMINA Longa é a espera, Amarga é a vida, Árduas as noites Quando perdidas. Vil é o pecado, Distante é o perdão, Dolorosos os sonhos Quando se vão. Vital é o afeto, Solene é o desejo, Ardentes os beijos Quando se dão. Lindo é o gesto, Suave é a sina, Intenso é o amor Quando germina.

TUDO SE FARÁ NOVO - Chico

Sempre haverá aqueles que se dedicarão ao aprendizado durante toda sua vida. Para eles haverá retornos mais intensos que partidas. E suas segundas vezes serão mais envolventes que as primeiras. TUDO SE FARÁ NOVO O céu conhecido jamais será o mesmo Depois que alguém partir. O abraço recatado jamais se reproduzirá Depois que alguém partir. O olhar reservado jamais terá o mesmo calor Depois que alguém partir. Mas os olhares serão muito mais inflamados Depois que alguém voltar. Os abraços serão muito mais cingidos Depois que alguém voltar. Os céus serão muito mais amplos e azuis Depois que alguém voltar.

A VIDA TEM DESSAS COISAS - Chico

A VIDA TEM DESSAS COISAS Eu chegava a um hotel da cidade histórica para um compromisso profissional. Claro que esse hotel ficava em frente a uma praça: ingrediente imprescindível a narrativas como esta. Era perto das três da tarde. Cruzando a praça, uma mulher me chamou a atenção pelo porte e pela beleza. Seus passos acelerados sinalizavam que a pessoa com quem ela iria se encontrar era especial. Acompanhei a cena bem de perto. Segundos depois um afetuoso abraço confirmou minha hipótese. Era visível o quanto se queriam bem e a ternura entre eles me contagiou. Enquanto trocavam palavras e sorrisos, uma chuva fina começou a cair. A mulher abriu uma colorida sombrinha – que parecia pequena para abrigá-los – e ambos caminharam juntos até uma lanchonete nas proximidades. Havia um detalhe específico que os caracterizava. Talvez não seja tão importante destacá-lo nestas linhas. No início da noite, meus amigos viriam me buscar para o jantar. Saí para esperá-los e

RESUMO - Chico

Na vida tudo tem seu tempo. RESUMO Não trago comigo arrependimentos: Poucas palavras fiz calar, Poucos beijos não recebi, Nenhum olhar desviei. Penso ter permitido a mim mesmo Todos os abraços necessários E os encontros indispensáveis Para que novos rumos se traçassem. Não consenti qualquer mágoa, Não reprimi qualquer afeto, Não escondi qualquer lágrima, Não recolhi qualquer adeus; Cruzei fronteiras sem retorno Atravessei ares turbulentos E me detive em calmos horizontes Para, em paz, construir meu pouso.

CANTIGAS DE NINAR ou NOITE DE SETEMBRO EM SINOP - Chico

Havia passado dois dias movimentados em SINOP, Mato Grosso, há quatro anos. Atendi ao convite para uma palestra e um minicurso: atmosfera festiva, pessoas essenciais ao lado e tantas coisas colorindo o ambiente. No início da segunda noite, um passeio pelas proximidades do hotel. Ruas calmas. Numa das casas foi possível observar a delicada mãe acalentando seu bebê. Acabei me lembrando de quando eu ninava minhas meninas. CANTIGAS DE NINAR  o u   NOITE DE SETEMBRO EM SINOP   A mãe acalentava seu bebê No quarto voltado para a rua calma Que me via passando naquela hora, Naquele tranquilo início de noite. Reconheci a emoção delineada Na voz característica de pais e mães Apaixonados pelos seus pequenos Todos os dias e noites de suas vidas. Lembrei-me das canções de ninar que compus Para embalar o sono de minhas meninas, Por quem continuo sempre apaixonado: Tantas canções, tanto amor, tanto tempo. Hoje, sei que quase nada posso fazer Em relaçã

"ATÉ HOJE FUI SEMPRE FUTURO" - Chico

Assim consta na parede da estação de metrô em Lisboa.   Não sei quantos reparam nessas palavras: frequentadores habituais costumam ser desatentos. Eu estava sozinho e era minha primeira vez naquela estação. Então, pude me deter diante da frase. Além disso, acredito que citações breves podem conter tanto significado quanto as páginas dos extensos romances. Considerei: somente é possível pensar em futuro a partir do passado. Mas passado não é sinônimo de dinamismo e aparece apenas nos contornos da esperança no que está por acontecer, criando espaço no qual são edificados o presente e suas projeções. Contestei a mim mesmo: foi o dinamismo do passado que iluminou o presente e permitiu que se elaborassem as perspectivas em relação ao que está por vir. Mergulhei na reflexão enquanto as composições chegavam e partiam. Deixei os minutos escoarem. Por um momento ponderei que a frase talvez fosse conclusiva. Novamente mudei de ideia. Tomei o próximo "comboio" e fui exper

AEROPORTOS - Maria Cristina

Aeroportos me encantam pela grandeza, impressionam pelo poder (de me permitir ir pra onde quero ou devo estar) e me enfeitiçam pelos mistérios que sabem guardar. Num dia desses, por conta dos atrasos, quase recorrentes nas decolagens brasileiras, resolvi tirar os olhos do meu livro e usar o tempo ocioso para observar quem passava por ali. Quantos sonhos, quantas angústias, quantas aventuras, saudades, segredos. Quantos desejos e quantos destinos cabiam naquele lugar? No primeiro segundo após a decisão de refletir, enxergo à minha frente uma mulher. Carregava uma bolsa no braço, parecia aflita, andava de um lado pro outro consultando e escrevendo alguma coisa em seu celular. Logo sentou-se ao meu lado uma garotinha linda, branquinha de cabelos claros, se expressava pouco e quase não sorria. Olhei pra ela, com olhos de quem pede. E ela falou. Seu nome é Luísa, tem 8 anos, de vez em quando falta à aula da sexta-feira e vai passar o fim de semana na casa do pai. Viaja pra isso.

CONHECIMENTO - Chico

Há descobertas que estabelecem novas fases na vida. Mas algumas dores serão inevitáveis . CONHECIMENTO Estive muitas horas quase sozinho Refletindo a inexistência conjuntural De alternativas. Persegui minha intuição abstrata Ignorando a transitória razão Das renúncias. Identifiquei os ermos da insônia Desenhando o confuso espaço Das utopias. Estive muitas horas quase sozinho, Desejando modos menos dolorosos De conhecer-me.

ENTRELINHAS - Chico

Há casas em que se cultivam muitos mistérios. Todos nós conhecemos algumas assim.   ENTRELINHAS Sobre as tábuas do assoalho, o que mais impressiona transcende ao que é visível. A cada instante a respiração se acelera e os sentidos se aguçam mas isto não vai suavizar a misteriosa atmosfera. Sobre as tábuas do assoalho, familiares transitaram e amigos se confessaram. Embora suposições ainda possam ser levantadas, há enigmas que permanecerão insolúveis por muito tempo. Sobre as tábuas do assoalho, os mais velhos se despediram e aos então presentes restou demonstrar sua aparente tristeza. Os demais acreditaram que o silêncio significaria mais que qualquer gesto. Sobre as tábuas do assoalho, as mágoas podem até ocupar quase todo o espaço. Mas, nas entrelinhas da vida, sempre restará a sensatez suficiente que, ao se manifestar, confirmará a não existência de esconderijos eternos e mistérios indecifráveis.

VINTE ANOS - Chico

Reginaldo Bessa assim escreveu a respeito de tema tão recorrente (e estava certo): " O tempo não para no porto, não apita na curva, não espera ninguém ". VINTE ANOS Não tenho mais vinte anos, - há quem os tenha - Os horizontes parecem diferentes Embora ternamente misteriosos; Com todas as suas inquietudes Mantêm inabaláveis os sonhos Como vestígios de magia adolescente E esperanças pelo que possa ser absoluto. Não tenho mais vinte anos Mas não tenho profundas saudades Nem, talvez, muitas lembranças: As remanescentes imagens ao redor Continuam gerando suficiente calma; Apesar dos inevitáveis embates Com algumas posturas deste tempo Ainda é possível vislumbrar convicções. Não tenho mais vinte anos, Apenas posso admirar quem os tenha, Amá-los a meu modo, silenciosamente, Aguçando a prudência dos sentidos, Cuidando dos termos e das emoções, Contemplando suas fisionomias, anseios E vivendo a extasiante aventura P

NOTURNA ROTINA - Chico

Não é a falta de espaço, de conforto e de tempo que constrói as incômodas rotinas noturnas. É a ausência de ilusões e expectativas. NOTURNA ROTINA Cama feita, Limpos lençóis, Travesseiro e manta, Silêncio costumeiro, Semiconsciência. Pés descalços, Dedos soltos, Hálito perfumado, Mente divagante Buscando ilusões. Luz artificial No quarto de dormir À espera por mais um dia. Como se fez ontem, Como se fará amanhã.

FRENTE-VERSO - Chico

As dores do tempo, do mundo e da vida se revelam de múltiplas formas. Mas sempre haverá olhares alternativos que permitem identificar a beleza guardada   em seu cotidiano, em seus cenários, em seus paraísos.  FRENTE-VERSO Por trás do tempo: seu tédio, sua fúria; sinais de incessante arrogância; miragens corroídas abalando as fronteiras da mente; medos antigos exercitando sua insistência; paraísos esquecidos inquietando-se em seus pesadelos. Por trás do mundo: seus caprichos, suas ruínas; monumentos erguidos ao desatino de caminhos mal percorridos; vozes condenadas ao silêncio da complacência; cenários convenientes à comodidade da omissão. Por trás da vida: seus dilemas, seus excessos; imprevisões do cotidiano gerando sintomas de mágoas; espantos inoportunos incentivando intenções de fuga e ausência; ânsias crônicas cristalizando apatia e marasmo. As coisas são muito mais belas se olhadas de frente.

MITOS - Chico

Aquilo que não foi vivido continuará sendo buscado. Nas longas noites, as companhias passageiras aquecem as ilusões, multiplicam as sombras e alimentam os mitos. Alguns entendem que esta é sua sina.     MITOS Beijo não dado, Perdido, sofrido, É o beijo buscado Nas sombras da noite. Meiga insônia, Luar, madrugada, Abraços afoitos E vozes veladas. Pressa, presságios, Os corpos vencidos Na doce volúpia De céus encenados. Pequena ilusão, Encontros de esquina, O leito tardio, Os mitos, a sina.

O TOQUE DAS MÃOS - Chico

O toque das mãos representa afinidade, doação, fascínio. Quem teve nas suas as mãos essenciais, nas tardes perfeitas, sabe o significado dessas palavras. O TOQUE DAS MÃOS Mãos encadeiam acenos, Testemunham intenções de Partida, chegada ou permanência. Mãos refletem raios de sol, Repercutem lúcido fascínio, Extinguem lágrimas e ausência. Mãos afagam percepções De aventura se disseminando Em genuínos sinais de júbilo.     Mãos: apenas tocá-las, Depois ir além, muito além, Voltar e apenas tocá-las.

OPÇÕES - Chico

Lapiseiras e teclados têm sido opções para o registro das ideias. A disputa entre eles foi intensa, mas vai se diluindo aos poucos. S ou testemunha disto. INSTRUMENTOS E MÃOS                        Ainda disputam, à minha frente, A velha lapiseira e o novo teclado. Não há concordância, é intransigente O debate, mas não me dou por achado. Ora me apego à cilíndrica companheira, Ora me valho do retangular equipamento, Ora me sirvo da primitiva maneira, Ora me quedo ao acessível instrumento. E, de palavra em palavra, De verso a estrofe me exprimindo, Vou recompondo a vida pelos fragmentos Formatados como convém à minha lavra: Ora ainda oculto o que estou sentindo Ora já esclareço a origem de meus intentos.

COSTUMES, ENCANTOS E ASPIRAÇÕES - Chico

É comum nos acostumarmos tanto aos nossos espaços que corremos o risco de não mais prestar atenção aos detalhes que caracterizam estes ambientes, às minúcias que os individualizam e não nos apropriarmos desses pequenos encantos. Os mesmos que fazem toda a diferença e são as verdadeiras razões de nossos apegos. Às vezes visitamos lugares e logo nos sentimos seduzidos por eles, atraídos pelas pessoas que nos acolhem e passam a nos inspirar, pelo significado de nossa permanência por lá, pelas lembranças intransferíveis que levamos conosco e que, certamente, nos acompanharão pela vida toda. Há, ainda, aquelas viagens únicas, a locais cujas impressões se perpetuam em nossos sentidos às quais vamos sempre nos referir como aspirações de retorno. Muitos deles não vão ocorrer, nem sempre a vida concede regressos. Mas, de algum modo, as recordações destes casos singulares estarão em nossas mentes por muito tempo. Porém, há lugares que conhecemos por um período ou pelos