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ÀS VEZES É DIFÍCIL VOLTAR PARA CASA - Maria Cristina


Quando nos reunimos para uma celebração, papai sempre me incentiva para aumentar minha participação em nosso blog.
Partindo para uma viagem de trabalho, me lembrei das palavras do Chico. Pensei comigo que, apesar da linda paisagem carioca, eventos profissionais não costumam ser inspiradores (sim, confesso que sempre preciso de algum estímulo para escrever).
Passei dois dias olhando pro mundo procurando motivos, razões e ideias para continuar contando minhas histórias.
Cogitei falar do mar, da lua (que essa semana resolveu caprichar), previ uma boa maneira de desejar bom dia ou boa noite às pessoas que considero queridas. Olhei para os que estavam ao meu lado. Permaneci somente nas tentativas.
Confesso que experimentei a frustração ao entrar no avião, de volta pra casa, sem nada em mente. Afinal são tantos (ou todos) os pretextos para as narrativas.
Distraí minha expectativa. Dizem que a vida tem dessas coisas.
O avião se mostrava cheio à medida que eu seguia pelo corredor. Um time de futebol carioca estava a bordo. Avistei um lugar vazio, o meu, na última fileira, na janela. Acomodei-me e a aeronave decolou sem atrasos e sem contratempos dessa vez.
Quase não tirei os olhos da paisagem: tudo lá fora parecia ainda mais belo quando admirado de cima.
Só me desconcentrei de minha silenciosa contemplação quando ouvi um dos comissários falando com o homem que estava ao meu lado (devia ter uns trinta anos, estava formalmente vestido e usava óculos escuros). Perguntou se se sentia bem e se precisava de alguma coisa.
Reparei, com algum atraso, que aquele homem chorava demasiadamente.
Achei um tanto estranha a resposta do passageiro ao funcionário da companhia aérea. Com a voz embargada disse que estava bem, mas que não queria voltar pra casa, preferia ter permanecido onde estava. O profissional, educadamente, se retirou e voltou a seus afazeres.
Continuei olhando para o cenário lá fora (não queria causar constrangimentos) e ainda ao som dos soluços me pus a pensar nas possibilidades infinitas daquela profunda e dolorida tristeza.
Muito mais rápido que eu podia imaginar, senti meus pés no chão.
O homem, enquanto esperava a abertura das portas, tirou os óculos,  enxugou os olhos, ajeitou a roupa e o cabelo, pegou uma pequena bolsa no maleiro, colocou uma bala na boca (como se tentasse desamargar seu momento) e seguiu como se o choro não lhe pertencesse.
Ele estava na minha frente na fila esperando por um táxi, aparentemente recuperado. Ainda que tenha imaginado centenas de motivos para aquela aparente aflição, jamais saberei as reais razões daquele que talvez eu não volte a ver.
Nesse instante, me veio uma música à cabeça, na voz do Chico (esse é o Buarque). (https://www.com/watch?v=WCnArLi3uCk)
Entrei no carro e agradeci pelas histórias (que estão aí pra ser contadas) e, principalmente, por eu ter tido, sempre, bons propósitos pra ir mas, também, para voltar.


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